Tradição

Presépio Vivo, da dona Cidinha Mahle, completa 50 anos

Em 1972 nascia um projeto que se tornou marca do Natal piracicabano

Da Redação
08/11/2022 às 09:04.
Atualizado em 08/11/2022 às 09:04
Paulo Celso de Souza e Cecília Elisabeth na primeira apresentação do presépio, na casa de Cidinha Mahle (Reprodução)

Paulo Celso de Souza e Cecília Elisabeth na primeira apresentação do presépio, na casa de Cidinha Mahle (Reprodução)

“Enquanto o coro canta, as figuras do presépio vão paulatinamente se colocando em cena e, com a chegada dos reis, o presépio está completo”. Esta é a síntese da síntese do Presépio Vivo, criado por dona Cidinha Mahle, em 1972, a partir de experiências domésticas de teatro, e que completa exatos 50 anos de realização, sempre apresentado em igrejas da cidade, nas atividades religiosas que antecedem o Natal. 

Ao ingressar em uma nova fase, desde o ano passado dona Cidinha faz dobradinha com Tânia Peticarrari, a maestrina que se tornou herdeira do projeto e pretende mantê-lo. “Ela é a herdeira dedicada para dar continuidade às apresentações, que comovem os que tomam parte e os que comparecem às encenações, criando sempre um ambiente espiritual adequado à grande festa de Natal do Jesus Menino”, garante dona Cidinha.

Ela costuma dizer que seu trabalho está feito, mas que não deveria parar. Esta parceria com a Tânia tem esse compromisso, de manter uma tradição, um projeto tão simples e, por isso, muito forte e envolvente. É uma constante em diálogos de adultos que participaram da peça dizer que, quando homem, entraram como burrinho e encerraram carreira como José, ou Rei Mago. As mulheres recordam que entraram pastorinha ou anjo e só se sentiram realizadas como Maria. Era uma carreira artística.

Memória em livro

Cidinha Mahle registrou em seu livro Recordações (de 1936 a 2021), que “na primeira apresentação, quem atuou como Maria foi a nossa filha Cecília (falecida no ano seguinte). “As Marias, Josés, Pastores, Pastoras, Bois, Burros e Reis se sucederam ao longo dos anos, representados por crianças e adolescentes, sempre na maior alegria”.

A ideia de perpetuar o Presépio Vivo esteva presente na proposta original, porque dona Cidinha olhava para a eternidade em tudo o que fazia. Com trajes simples, com personagens caracterizados de modo exemplar, as igrejas passaram a disputar as apresentações, que se resumiam a quatro ou cinco delas por ano, sempre na época do advento. 

Roupas e símbolos usados atualmente são os mesmos de 1972, ou até antes disso, nos ensaios experimentais. O que houve nessas cinco décadas foram apenas reparos. A orelha do burro caía, por algum acidente; a Estrela de Belém pedia uma das pontas, estava lá seu Mahle, com a paciência e o dom de artesão que Deus lhe deu, corrigindo detalhe por detalhe em sua oficina. Rapidamente o figurino estava inteiro e em ordem para uma nova apresentação. 

De próprio punho

Dona Cidinha fez questão de registrar de memória sobre a origem do Presépio Vivo, passo a passo para a Gazeta de Piracicaba: 

“Esse projeto foi idealizado pensando em nossa filha Cecília Elisabeth, que em 1972 contava 14 anos. Ela era deficiente visual e gostava muito de música e de teatro. Havia na época, em São Paulo o teatro de Arena, que proporcionava aos domingos apresentações para crianças e jovens. E nós todos, da família Mahle, quando íamos para lá, gostávamos de assistir as apresentações. Disso resultou a vontade de fazermos ‘teatrinhos’ em nossa casa, com filhos e vizinhos. Encenamos pequenas peças e depois avançamos. 

“Compramos também muitos livrinhos com pequenas peças teatrais e chegamos então à principal autora de peças para a juventude: Maria Clara Machado, com a obra ‘O boi e o burro a caminho de Belém’. Dentro dessa obra era formado um presépio. Ela foi nossa inspiração. Encenamos em casa a peça, com nosso filho Cláudio e Francisco, um vizinho representado os personagens principais. Tínhamos um bom espaço e vieram crianças da redondeza e seus pais para assistir.

“Naturalmente, o presépio foi encenado, tendo Cecília como Maria e Paulo Celso de Souza, também nosso vizinho, como José. Contávamos ainda com pastoras, pastores, reis magos, anjos, personagens interpretados por crianças da família da vizinhança ou filhos de amigos. Essa apresentação, muito modesta, foi um sucesso. Daí surgiu a ideia de, por ocasião do Natal, formarmos um presépio com crianças e jovens da Escola de Música de Piracicaba, (então EMP) e convidadas. O coro da escola cantava músicas escolhidas, especialmente para a formação do presépio.

“Em 1973 fizemos pela primeira vez o presépio em igrejas. Foi um ano muito difícil para nós, porque em abril, Cecília, nossa filha, faleceu. Mas o presépio seguiu, sempre com as figuras representando o nascimento de Jesus. Crianças, Jovens, pais e assistência estimulando a continuação ano após ano e, assim, o presépio tem seguido até hoje. Faz parte da tradição da Empem e todos os que participaram das encenações lembram-se sempre das mesmas, achando que eles (das gerações anteriores) sabiam interpretar melhor...

Peticarrari

De acordo com a maestrina Tânia Peticarrari, o Coral Cocre, da Cooperativa Siccob Cocre, e o Coral Canto do Terras, coral feminino do Terras Piracicaba, vão cantar as músicas arranjadas pelo Maestro Ernst Mahle. Os ensaios, por sinal, estão em andamento.

“É uma grande honra para mim estar à frente do Presépio Vivo e poder dar continuidade a essa criação genial de Cidinha Mahle. É um projeto que existe há 50 anos interruptos, com a coordenação da dona Cidinha e músicas do Maestro Ernst Mahle. Nossa intenção é continuar exatamente como ela sempre fez, nos mesmos moldes. 

“Este ano ela estará no ensaio geral com a gente, nos orientando. Então, ainda temos o privilégio de contar com a dona Cidinha no comando. Estamos pegando o jeito, porque não se trata de um projeto simples. Há as vestimentas características, símbolos, todo o figurino foi criado por ela e fabricados pelo maestro. É o mesmo figurino original guardado com tanto carinho. Vamos preservar tudo do jeitinho que ela faz. 

“Por isso precisamos saber como as crianças levam as roupas, como devolvem, como devem ser guardadas. Vamos ter uma equipe para fazer isso. A Luciana e o Sérgio Pimpinato vão cuidar dos figurinos. A secretaria da Empem está fazendo contato com os pais das crianças que querem participar. Eu estou preparando os coros e, assim, assumindo a direção das apresentações dos grupos de vozes. Por isso quero deixar claro que se trata de um trabalho coletivo, de todos nós. Todo mundo está unido para dar sequência a esse legado da dona Cidinha, que é uma pessoa tão importante para Piracicaba. 
“Além de todo esse envolvimento do casal Mahle e a reverência a eles, o Presépio Vivo representa também a Escola de Música de Piracicaba Ernst Mahle (Empem), que é uma referência nacional. Não existe honra maior para mim que fazer parte desta equipe”, disse Tânia.

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