O governo planeja publicar no início de junho a regulamentação da cota de importação de 11 itens da siderurgia, anunciada no final de abril. O estabelecimento de cotas - com imposto de importação majorado a 25% sobre o que entrar além do limite - foi definido pela Câmara de Comércio Exterior (Camex), mas, para entrar em vigor, precisa ser regulamentado.
O Executivo precisava cumprir algumas etapas para publicar as regras, como obter o aval dos parceiros do Mercosul. Além disso, teve de estudar formas para evitar que uma corrida pela compra de produtos atropele importadores com menos capacidade. A medida terá validade de 12 meses, a partir da publicação da portaria.
A forma como o governo vai operacionalizar o regime de cotas é acompanhada com atenção e ansiedade pelo setor. Esse alerta foi dado nesta segunda-feira, 20, diretamente ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva e ao vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin.
Em discurso no encontro promovido no Palácio do Palácio do Planalto, o presidente executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello Lopes, disse ser "imprescindível' que o sistema "cota-tarifa" seja eficiente e bloqueie as importações "predatórias".
"O sistema é novo no Brasil e precisará ser acompanhado e refinado", observou Lopes.
Técnicos já têm apontado nos bastidores que a implementação das cotas vai exigir monitoramento sob diversos aspectos. Por exemplo, o governo terá de verificar se o cálculo da cota - que é a média de importação entre 2020 e 2022 acrescido de 30% - está correto, superestimado ou subestimado.
A avaliação é que a metodologia poderá ser constatada como imprecisa, por exemplo, se a importação de nenhum dos aços afetados chegar ao limite da cota, porque dessa forma o governo não estaria conseguindo proteger efetivamente a indústria nacional das compras externas.
Além disso, a Camex ainda precisará monitorar o comportamento das outras NCMs não incluídas na decisão - pelo risco de a importação desses itens aumentar em substituição aos que terão sobretaxa ("NCM de fuga"). Por fim, a Camex também terá de dar uma resposta sobre os quatro produtos siderúrgicos que restaram na pauta para uma segunda avaliação. Entre eles estão aços usados em oleodutos ou gasodutos e em revestimento de poços.
Investimentos
Representantes da indústria do aço apresentaram ao presidente Lula investimentos de 100,2 bilhões (US$ 19,4 bilhões) em cinco anos no encontro desta segunda. A iniciativa foi condicionada à "eficácia" das medidas de controle e defesa comercial adotadas pelo governo.
Alckmin comemorou a previsão de investimentos pela indústria siderúrgica. Em conversa com a imprensa após reunião, ele listou medidas tomadas pelo governo para o setor.
"São R$ 100,2 bilhões de investimento anunciado hoje. Fizemos trabalho no Mdic estabelecendo cotas, por preocupação à importação de aço, que levou à ociosidade em indústria de base importante. Também agimos na defesa comercial, estabelecendo cinco mecanismos antidumping, comprovados os dumping, e dez investigações em curso (...). Isso foi entendido pela indústria e o resultado são R$ 100 bilhões de investimento, melhorando competitividade, gerando emprego e renda", disse Alckmin.
Ele avaliou a implementação do sistema cota-tarifa como um primeiro passo para combater o excesso das compras vindas da China e cobrou que o regime seja executado de forma eficaz e monitorada.
O vice-presidente afirmou ainda que Lula deve sancionar, na próxima semana, a depreciação acelerada para indústria, com incentivo fiscal para estimular a indústria a investir em novas máquinas e equipamentos.
A "depreciação acelerada" funciona como uma antecipação de receita para as empresas em um período de dois anos. O programa permite que as empresas abatam o valor das compras de um bem de capital (como maquinário e equipamentos) nas declarações futuras de Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
O texto foi aprovado no Congresso no final de abril. Pelo texto aprovado nas duas Casas, esse abatimento dos produtos comprados em 2024 poderá ser feito em dois anos, e não em até 25 anos, como previsto anteriormente. O projeto é uma das prioridades da agenda do Mdic.
O governo estimou uma renúncia fiscal de no máximo R$ 1,7 bilhão com o programa em 2024. Pelo texto aprovado na Câmara e no Senado, o valor poderá ser ampliado por meio de decreto caso haja espaço no Orçamento.
Patamar 'inaceitável'
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse nesta segunda que o consumo de aço no Brasil está baixo e vai aumentar. Ele deu a declaração durante a solenidade com representantes do setor.
"Tenho certeza que o consumo de aço vai aumentar muito, ele está num patamar inaceitável", declarou. Haddad afirmou que medidas na área microeconômica permitem o governo apoiar comércio, indústria e serviços.
Segundo o ministro, o Brasil será mais competitivo no mercado global de aço se mirar na produção verde. "O aço verde terá apelo no mercado internacional", disse, acrescentando que o produto deve se tornar o "carro-chefe."
Ele defendeu a criação da cota-tarifa para importação de aço e disse que os países centrais da economia global estão mais protecionistas. "O Mdic foi muito bem em eliminar concorrência desleal (em aço)." Haddad também afirmou que o País precisa ficar atento para mudanças geopolíticas. Segundo ele, isso não é adotar "dogmas sem olhar o comportamento dos parceiros".
O ministro afirmou que o Brasil tem a capacidade de alavancar sua produção de aço com medidas voltadas à indústria automobilística e com o Minha Casa, Minha Vida.
Ele ainda pediu apoio dos industriais para a regulamentação da reforma tributária no Congresso e para a votação do marco dos seguros. De acordo com Haddad, os Três Poderes estão construindo um novo cenário econômico em aliança com a iniciativa privada. Ele disse que "o trabalho tem que continuar", sem se deixar levar por "vozes dissonantes." (COM SOFIA AGUIAR E CAIO SPECHOTO)