O ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), voltou a criticar nesta semana decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF).
Em aula magna na Escola da Magistratura da Justiça Militar, em Brasília, o ministro disse que, ao reconhecer uniões homoafetivas e autorizar a interrupção da gravidez de fetos com anencefalia, o STF incorreu em 'ativismo claríssimo'.
"No fundo é tentar se impor uma visão minoritária e usar o Judiciário para isso", afirmou na palestra sobre 'ativismo judicial'. Gandra foi presidente do TST entre 2016 e 2018.
A declaração foi dada em meio aos sucessivos ataques do presidente Jair Bolsonaro (PL) e de seus aliados ao STF. Na última quinta-feira, 31, o embate entre o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal aumentou de temperatura. Sem citar expressamente o nome do ministro Alexandre de Moraes, que incomoda os bolsonaristss com suas decisões, Bolsonaro disparou: 'Cale a boca! Bota a tua toga e fica aí sem encher o saco dos outros'.
Gandra avalia que o Poder Judiciário tem avançado o sinal e interferido indevidamente na atuação do Legislativo e do Executivo.
"O epicentro da crise política brasileira está no Poder Judiciário, quando ele desborda das suas atividades, que são de julgar, para começar a legislar ou querer traçar políticas públicas", afirmou no evento. "Hoje nós somos um poder desprestigiado, porque nós queremos assumir atividades que não são as nossas."
O magistrado ainda sugeriu que o artigo 49 da Constituição Federal, que prevê que compete ao Congresso Nacional 'zelar pela preservação de sua competência legislativa em face da atribuição normativa dos outros Poderes', pode ser usado para cassar decisões do STF consideradas invasivas.
O ministro afirmou ainda que magistrados têm sido contaminados pelo 'vírus de querer ter um protagonismo maior do que já se tem'.
"Abrir inquérito de ofício, não existe. Criar crime por decisão judicial, fugir do tipo penal ou criar crime por analogia. Nós estamos fugindo totalmente dos princípios básicos que a Constituição - tal como foi pensada em 1988 e que tem solução para os nossos problemas - prevê como garantias", disparou.
Outra crítica foi dirigida ao que chamou de 'indisciplina judiciária', ou seja, casos em que os magistrados ignoram a jurisprudência e decidem conforme a própria vontade.
"O Supremo, em muitas ocasiões, não respeita a Constituição Federal. Os tribunais superiores não respeitam a jurisprudência do Supremo. Os tribunais regionais e de Justiça não respeitam a jurisprudência pacificada dos tribunais superiores. E juiz de primeira instância, cada um sai atirando do jeito que quer, porque vê o exemplo de cima", disse.
Gandra também repreendeu magistrados que, segundo ele, fazem um 'malabarismo jurídico para justificar determinadas decisões'.
"Primeiro eu quero que a solução seja essa, depois eu vou procurar se tem fundamento aquilo que eu vou estabelecer como decisão", ironizou.
O ministro do TST disse que falta 'autocrítica e humildade' do Poder Judiciário.
"Quando você nota uma grita geral da sociedade, alguma coisa está acontecendo de errado", pregou. "Eu peço: pelo amor de Deus cumpram a lei, porque hoje o que está imperando é a vontade do magistrado frente a lei. ( ) Se o Poder Judiciário está compondo bem os conflitos sociais, nós não temos crise institucional, nós não temos crise política, nós não temos crise social."