O resultado do exame aplicado pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp) aos estudantes recém-formados levantou o alerta da categoria e também da população. Isso porque 59,2% dos formandos em medicina foram reprovados na prova, ou seja, não acertaram 60% das questões. As escolas privadas tiveram maior índice de reprovação (71%). Esse é o segundo ano em que o exame é obrigatório, mas o resultado não impede que o estudante obtenha registro profissional.Apenas nove instituições de ensino tiveram média de acerto acima de 60%. O desempenho das universidades, porém, não será divulgada pelo conselho, que fez um acordo com as entidades para que o resultado seja mantido sob sigilo. O exame foi aplicado em novembro — 1,6 mil alunos fizeram a avaliação em todo o Estado de São Paulo, sendo 106 da Unicamp e 93 da PUC-Campinas.Entre as questões que a maior parte dos estudantes não soube responder está uma sobre sintoma de tuberculose: 64% erraram a pergunta sobre o sistema respiratório que define o paciente com suspeita da doença, por exemplo.A conselheira do Cremesp em Campinas, Silvia Mateus, afirma que o resultado da avaliação é preocupante, principalmente por se tratar de uma prova considerada de nível médio para baixo. Em 2013, o índice de alunos reprovados foi de 54,5%. “Estamos lidando com vidas, pode haver risco para a própria população”, disse.Para ela, o principal motivo para esse resultado está na criação excessiva de faculdades de medicina que, muitas vezes, não têm estrutura para capacitar o aluno, especialmente com hospitais. “Você vê algumas faculdades funcionando apenas com enfermaria. O aluno não tem contato com uma UTI (Unidade de Terapia Intensiva) neonatal, não tem acesso a casos diferentes. O que esse aluno vai aprender na prática?”, questiona a conselheira.O Cremesp defende que seja obrigatória a realização de exames para que o recém-formado obtenha o registro profissional, como é o caso dos advogados que têm de fazer provas na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).O professor Wilson Nadruz Junior, coordenador do curso de Graduação de Medicina da Unicamp, concorda que os resultados são preocupantes, mas avalia que a metodologia do exame aplicado pelo Cremesp não é “muito satisfatória”. De acordo com ele, uma prova apenas teórica não é capaz de avaliar as condições do aluno. “É importante ter avaliações práticas para verificar qual o desempenho do médico”, disse.Apesar das críticas em relação à metodologia, Nadruz Júnior afirma que as universidades têm de levar em considerações avaliações como a do Cremesp. “É preocupante e acho que as escolas não devem, pelo menos a Unicamp, se furta a avaliações externas.”Na Unicamp são realizados exames, junto com outras instituições públicas — como a Unesp, por exemplo — para avaliar a evolução dos alunos de medicina no decorrer da sua formação. O Teste Progresso, como é chamado, faz comparações do desempenho dos estudantes e identifica os déficits das disciplinas.O aluno do 4 ano da Unicamp e ex-integrante da Direção Executiva Nacional dos Estudantes de Medicina, André Citroni Palma, é contra a aplicação da prova como critério para que o profissional obtenha registro. “O Cremesp quer limitar o mercado”, disse. Ele também afirma que o exame do conselho não é capaz de fazer uma avaliação real da capacidade do aluno. “Concordo que muitas escolas de medicina não têm estrutura. Se a pessoa quiser fazer um cursinho, ele passa na prova, a avaliação tem de ser progressiva”, disse.Palma defende que o conselho realize discussões sobre a situação das universidades e sobre seu sistema de ensino. “Se o conselho quisesse avaliar o estudante e formar o melhor profissional para a saúde, iria fazer discussão sobre educação médica com a gente, o conselho nunca esteve a par das deficiências do ensino”, disse.Em 2013, segundo o conselho, houve baixo boicote à prova (quando os alunos assinalam todas as questões “b”), cerca de 2%. Elas não foram compiladas no resultado final.Relatório para o MECO relatório da avaliação será enviado ao Ministério da Educação. O MEC possui um método próprio de análise, o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade). Por meio de nota, o ministério informou que várias ações foram implementadas nos últimos anos para melhorar a qualidade dos cursos de medicina.Entre as medidas está, por exemplo, uma nova avaliação, por meio do Mais Médicos, das instituições que possuem graduação em Medicina a cada dois anos. O ministério também realizou a ampliação dos critérios exigidos para o funcionamento dos cursos; adoção de nova sistemática para abertura de cursos de medicina e “ampliação dos procedimentos de supervisão, aperfeiçoamento dos instrumentos de avaliação in loco para os cursos.” Saúde pública tem pior desempenho O exame também revelou baixo desempenho dos alunos em determinadas áreas da medicina. As médias mais baixas foram obtidas nas questões que envolviam pediatria (47,8%), clínica médica (52,03%), clínica cirúrgica (52,13%), ginecologia (56,48%) e saúde pública/epidemia (59,25%).Na área de pediatria, por exemplo, 67% dos estudantes erraram, no suposto atendimento de um menino de oito anos, em qual seria o agente que causaria tosse gradualmente progressiva um período de duas semanas. Também 67% não soube afirmar que o grau de redução da pressão arterial é o principal fator determinante na diminuição do risco cardiovascular em paciente hipertenso.Os alunos das escolas privadas tiveram maior índice de reprovação (71%) em comparação com as instituições particulares — 33,9% foram reprovados. O resultado é semelhante ao exame de 2012, quando os estudantes de cursos privados de medicina tiveram 54,38% de média de acertos contra 63,7% dos alunos de instituições públicas. 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