Formatura em presídio

Apenas 30 participaram da cerimônia

Mas 179 sentenciados vão receber diploma do ensino regular

Ana Cristina Andrade
18/12/2022 às 11:26.
Atualizado em 18/12/2022 às 11:26

Paramentado, grupo de sentenciados participou da formatura representando os 179 que se formaram no ensino fundamental e médio; direção disse que número de homens na cerimônia foi restrito por conta das medidas de segurança impostas da Secretaria da Administração Penitenciária (Mateus Medeiros/Gazeta de Piracicaba)

A manhã de quinta-feira (15), dia normal para a maioria dos presos que cumprem sentença na penitenciária masculina de Piracicaba, foi muito diferente e de muita expectativa para 30 homens que aguardavam o momento de entrar numa sala.

Era o dia da cerimônia de formatura, a primeira pós-pandemia do coronavirus, que envolveu estudantes do ensino fundamental e médio.

Os uniformes na cor bege mal foram percebidos debaixo da beca na cor preta e a faixa vermelha. Os chinelos de dedo, usados em dias comuns na unidade, deram lugar a sapatênis. Na cintura, a faixa vermelha - que entre tantas palavras representa a força e o poder - e na cabeça o capelo (chapéu).

Chega o momento de se apresentar para a diretoria da unidade prisional e convidados, que são magistrados, outras autoridades e os docentes da escola vinculadora (Escola Estadual Professor Elias de Mello Ayres), responsável pelas aulas que são ministradas dentro da penitenciária.

A abertura é feita pela Orquestra Sinfônica de Piracicaba. O orador dos sentenciados, A.A.M., 42, agradeceu aos professores que os ajudaram a viver o momento tão especial. "Eles se dedicaram para que chegássemos a um ensino de qualidade, nos tornando capazes de alcançar uma nova etapa de nossos estudos", declarou.

"Mesmo em tempo de pandemia eles se fizeram mestres nos proporcionando, por meio dos roteiros e atividades, a possibilidade em continuarmos estudando", acrescentou. 

De acordo com a direção da penitenciária, somente 30 alunos participaram presencialmente da formatura, por medida de segurança, mas eles representaram 179 que concluíram os estudos.

A.M.K., 2, disse que vê essa conclusão do curso como uma grande oportunidade porque, com estudo, se pode vencer em várias situações. "Quando eu sair daqui, espero ter oportunidade de mudar completamente de via, para melhor, porque do lado de fora tem quem dependa de mim. Quero cursar a faculdade de Química", contou.

A.A.M., 41, relatou que teve essa oportunidade de regressar aos estudos e com isso aumenta, também, a chance de retornar à sociedade. "E retornar à sociedade com dignidade. Quero me formar em Engenharia Agrônoma e poder construir uma nova história", enfatizou.

Para S.S.V., 28, que concluiu o ensino fundamental, isso pode lhe abrir portas para grandes e boas escolhas e conquistas. "Minha perspectiva, pra o futuro, é poder não somente aproveitar as boas oportunidades que a vida me reserva, mas realizar meus sonhos", explicou. Ele disse quer cursar não uma, mas duas faculdades: Administração e Gastronomia.

A.E.S., 46, falou que vai agarrar esta chance para nunca mais deixar escapar. "Pretendo voltar para minha família, reconquistar meus filhos e netos, dar mais valor a tudo e a todos. Quero cursar Educação Física", destacou.

V.R.A., 29, emendou: "pretendo arrumar emprego, me formar e abrir meu próprio negócio, ajudando quem passar pelo mesmo processo que eu. Minha intenção é fazer um curso de mecânica automotiva".

Nada é por acaso

Elcio José Bonsaglia, diretor técnico III da penitenciária de Piracicaba, disse entender que a quinta-feira foi um dia programado para a formatura e que nada é por acaso.

"Eles tinham que estar ali, completando um ano letivo, onde os professores se dedicam e vêm todos os dias paara passar conhecimento não só de matérias específicas, mas de vida para eles, para que possam assimilar e levar aquilo para a vida deles pós cumprimento de pena. Que isso seja voltado para o fortalecimento do caráter deles, da postura, da conduta, que é muito importante", declarou.

"Eu disse a eles que este momento não os define. É um momento transitório, em que eles estão cumprindo pena. Amanhã, eles poderão estar em liberdade e aí sim, através desse esforço deles aqui em cumprirem um ano letivo, quando estiverem em liberdade, é que vão poder demonstrar o que os define, que será o caráter deles modificado, a conduta melhorada, a postura digna e honrada perante a sociedade, que irá recebê-los", acrescentou. 

Bonsaglia disse esperar que eles saiam, da unidade prisional, melhores do que entraram, e essa é a missão tanto da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária, como a dele enquanto gestor dessa unidade prisional. "Minha missão é a ressocialização", completou. 

Anísio Caixeta, defensor público do Estado de São Paulo e atuante em Piracicaba, declarou que se sentiu honrado em participar da cerimônia de formatura dos sentenciados.

"Parabenizo, de forma efusiva, a penitenciária de Piracicaba por ter conseguido propiciar a educação aos presos. Sabemos que ainda não atinge a todos, mas os passos iniciais têm sido dados, sobretudo no período de pandemia e pós-pandemia", observou.

"Parabenizo, também, a direção pela delicadeza de reconhecê-los, em suas dignidades de formandos, propiciando a todos uma bela festa de conclusão de curso". 

A EE Prof. Elias de Mello Ayres foi representada, além dos professores, pela coordenadora pedagógica Adriana Flávia Galvani. A responsável pela escola dentro da unidade prisional é Priscila de Almeida Cunha e quem assessora todas as áreas dentro do presídio é Paulo César Cavalheiro Faria.

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