Quando Donald Trump espiar o gramado da Casa Branca pela última vez a bordo de seu helicóptero na quarta-feira, os estragos de sua Presidência serão inegáveis.
O showman de cabelos tingidos, bronzeado artificial e um talento para se conectar com as multidões assumiu o mandato quatro anos atrás, fazendo em seu discurso inaugural a promessa de que poria fim à "carnificina americana".
Mas Trump, que se autodenomina um "gênio" único, capaz de fazer o que nenhum presidente conseguiu, se transformou em um que deixou uma verdadeira chacina para trás.
A bordo do Marine One, Trump, de 74 anos, vislumbrará uma capital transformada em um acampamento armado, no rastro do caos deixado por seus apoiadores em 6 de janeiro.
Soldados da Guarda Nacional com fuzis automáticos se espalham por toda a cidade. Barreiras, mais comumente vistas em cidades como Bagdá, bloqueiam ruas desertas.
Mais tropas estão mobilizadas agora em Washington do que no Afeganistão. São americanos defendendo americanos de outros americanos.
E quando vir a cúpula branca do prédio do Capitólio, Trump poderia se lembrar que, quando assumiu a Presidência, em 2017, os republicanos controlavam a Casa Branca e as duas câmaras do Congresso pela primeira vez em uma década. Nada, aparentemente, poderia ficar em seu caminho.
"Nós vamos vencer tanto que vocês vão ficar cansados de vencer", costumava dizer a seus apoiadores.
No entanto, na manhã de quarta-feira, Trump deixará a cidade acumulando derrotas.
Ele é o presidente de um único mandato, marcado pela façanha de enfrentar um impeachment duas vezes. E os democratas, não os republicanos, agora estão no controle da Casa Branca e das duas casas do Congresso - em boa parte graças ao papel de Trump na perda de dois assentos republicanos praticamente certos na Geórgia.
Mas nem tudo é culpa de Trump.
A pandemia de covid-19, surgida na China e que chegou aos Estados Unidos e à Europa há um ano, foi um desastre inesperado que muitos outros países ricos também lutam para conter.
E esta pandemia - que deixou nos Estados Unidos quase 400.000 mortos - provocou ondas de desemprego, arruinou empresas e exige inacreditáveis volumes de dinheiro dos contribuintes para manter a economia funcionando.
Embora Trump seja acusado de má gestão da crise sanitária, provavelmente nenhum presidente poderia ter resistido a um tsunami de más notícias como este.
Contudo, Trump chegou garantindo ser diferente. Alguém à parte.
"Não esperto", como se vangloriou em 2018, "mas genial".