INTERNACIONAL

Família de bombeiros desaparecidos de Beirute aguarda apenas os "restos mortais"

Rita não dorme há mais de uma semana e aguarda notícias do filho, do sobrinho e do genro, todos bombeiros que seguiram para o porto de Beirute para apagar o incêndio provocado pelas explosões de 4 de agosto e que permanecem desaparecidos

AFP
12/08/2020 às 07:25.
Atualizado em 25/03/2022 às 16:52

Rita não dorme há mais de uma semana e aguarda notícias do filho, do sobrinho e do genro, todos bombeiros que seguiram para o porto de Beirute para apagar o incêndio provocado pelas explosões de 4 de agosto e que permanecem desaparecidos.

"Inteiros ou em pedaços, queremos nossos filhos", afirma a mulher, de 48 anos. Ela perdeu a esperança de ver os parentes com vida.

"Há seis dias que esperamos os restos mortais de nossos filhos, que nos entreguem, mesmo que seja apenas um pedaço, dois, mas algo", insiste, esgotada.

Na casa da família, na área de Qartaba (ao nordeste de Beirute), dezenas de amigos, parentes e vizinhos dão apoio a Rita.

As mulheres não falam nada e os homens conversam em voz baixa.

Em uma parede próxima à entrada da casa há uma grande foto dos três homens, sorridentes, com a menção "os heróis". Nayib Hitti tinha 27 anos, seu primo Charbel 22 e seu cunhado Charbel Karam 37.

No dia 4 de agosto, os bombeiros de Beirute foram alertados sobre um incêndio no porto, próximo ao principal quartel da corporação. Os três foram enviados ao local, ao lado de sete colegas, sem saber o que aconteceria no depósito número 12.

A equipe tentou forçar a porta do edifício, trancada a chave, sem ter ideia de que o local armazenava substâncias perigosas, explica Georges Hitti, que no mesmo dia seguiu para o porto à noite em busca dos parentes.

"Comecei a gritar como um louco: Charbel, Nayib, Charbel. E depois comecei a chorar", conta.

O incêndio provavelmente provocou a explosão de uma grande quantidade de nitrato de amônio que estava armazenado no depósito. A tragédia devastou bairros inteiros da capital libanesa e deixou mais de 160 mortos, além de 6.000 feridos.

Um integrante das Forças de Segurança Interna (FSI) que sobreviveu à explosão disse a Hitti que uma patrulha pediu aos bombeiros que se afastasse, mas era muito tarde: a deflagração atingiu a equipe.

"Nós enviamos heróis, eles nos entregam mártires", afirma Rita, com ira e amargura. Ela usa um broche com a foto dos três.

Sua filha Karlen, mãe de duas crianças, perdeu o marido, o irmão e o primo. Ela chora, em silêncio.

As autoridades ignoraram as famílias, que pediram para participar nas buscas dos desaparecidos.

"Eu disse: "deixem que procuremos, eu conheço o cheiro dos meus filhos, saberei encontrá-los"", comenta.

No domingo, o exército libanês anunciou o fim das operações de busca. Na segunda-feira foram encontrados cinco corpos, que ainda não foram identificados.

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