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Lei de regularização fundiária aumenta tensões na Amazônia

Um projeto de lei para regularizar ocupações de terras públicas não destinadas tem aumentado os temores em relação a uma possível intensificação dos desmatamentos e conflitos agrários, principalmente na Amazônia, em um contexto de desmonte das normas ambientais pelo governo de Jair Bolsonaro

AFP
04/06/2020 às 09:38.
Atualizado em 27/03/2022 às 21:36

Um projeto de lei para regularizar ocupações de terras públicas não destinadas tem aumentado os temores em relação a uma possível intensificação dos desmatamentos e conflitos agrários, principalmente na Amazônia, em um contexto de desmonte das normas ambientais pelo governo de Jair Bolsonaro.

A ocupação desordenada de aproximadamente 600.000 km2 de terras públicas (uma área equivalente ao território da França) para atividades agrícolas ou a exploração de recursos terrestres ganhou impulso desde a ditadura militar (1964-1985), mas sem outorgar sistematicamente escrituras de propriedade.

Esse vácuo jurídico permitiu que muitos monopolizassem e desmatassem essas terras, além de vendê-las com falsas escrituras. Esse tipo de fraude, conhecida como "grilagem", é a principal causa do desmatamento descontrolado e das violentas disputas territoriais.

Em 2009, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva lançou um programa de "terras legais" com o objetivo de regularizar cerca de 150.000 propriedades abertas até 2004, principalmente com o objetivo de desenvolver a agricultura familiar.

Mas esse plano só foi cumprido em 20%. Em 2017, as regras foram flexibilizadas e, com a chegada de Jair Bolsonaro ao poder, os processos de regularização foram praticamente suspensos.

O projeto prevê critérios ainda menos rigorosos para a regularização e avança junto a outro projeto do presidente de extrema direita, que tem como objetivo autorizar a mineração e a exploração agrícola em terras indígenas.

"Se o objetivo do governo fosse realmente regularizar os pequenos agricultores, não precisava mudar a legislação", mas iria dispor de "mais recursos colocados e vontade política", disse à AFP Elias Borges, secretário de política agrária da Confederação Nacional de Trabalhadores Agrícolas (Contag).

Borges critica que o governo pretenda aumentar de 440 para 1.650 hectares o tamanho das propriedades que estariam dispensadas de vistorias prévias para sua regularização. O controle seria feito posteriormente por satélite.

O relator do projeto na Câmara dos Deputados propôs uma solução de compromisso para 660 hectares, mas, segundo a advogada Juliana de Paula Batista, do Instituto Socioambiental, é apenas um "recuo estratégico", uma vez que o governo "continua querendo impor mudanças na tramitação" para editar o texto.

As tentativas de ampliar territórios regularizáveis sem controle prévio preocupam Brenda Brito, pesquisadora do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).

"Não dá para ver os conflitos agrários por satélite, e nem todos são registrados pelas autoridades. Não tem procedimento robusto de checagem de bancos de dados, por exemplo os do Cadastro Ambiental Rural, onde tem a sobreposição de imóveis. A prioridade deveria ser falar como empoderar órgãos fundiários para fazer a fiscalização", afirma.

Brito também se preocupa com a facilidade com que o projeto permitiria que os infratores não respondessem por possíveis crimes ambientais, firmando um simples compromisso com um suposto bom comportamento, algo difícil de controlar.

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