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O Ártico derrete, mas quem se importa?

Cientistas do governo americano informaram nesta semana que a capa de gelo do Oceano Ártico encolheu ao seu segundo nível mais baixo desde o início das medições por satélite, em 1979

AFP
22/09/2020 às 15:05.
Atualizado em 24/03/2022 às 11:38

Cientistas do governo americano informaram nesta semana que a capa de gelo do Oceano Ártico encolheu ao seu segundo nível mais baixo desde o início das medições por satélite, em 1979.

Até este mês, pela primeira vez nos últimos 42 anos, a capa de gelo da Terra cobria menos de 4 milhões de km2.

A tendência é clara: a extensão da capa de gelo diminuiu 14% por década durante esse período. O Ártico pode experimentar um primeiro verão sem gelo a partir de 2035, conforme publicaram no mês passado cientistas na Nature Climate Change.

Mas se toda essa massa de gelo e neve derretidos não aumentam diretamente o nível do mar, assim como cubos de gelo derretidos não fazem transbordar um copo d"água, há uma questão incômoda: quem se importa?

Trata-se de um alerta importante.

"O declínio da camada de gelo do Ártico no verão é um dos sinais mais claros e inequívocos da mudança climática", explica Julien Nicolas, um especialista em Ártico que integra o programa de observação da Terra da União Europeia (UE).

Talvez a coisa mais básica a se notar, de acordo com os cientistas, é que o encolhimento da capa de gelo não é apenas um sintoma do aquecimento global, mas também um fator que o desencadeia.

"A diminuição do gelo marinho afeta o oceano escuro (profundo), o que cria um poderoso mecanismo de retroalimentação", disse à AFP Marco Tedesco, geofísico do Instituto da Terra da Universidade de Columbia.

A neve que acaba de cair reflete 80% da força radiativa do Sol de volta ao espaço.

Mas quando essa superfície semelhante a um espelho é substituída por outra de água azul profunda, aproximadamente a mesma porcentagem da energia de aquecimento da Terra é absorvida.

E não se trata de uma área equivalente a um endereço postal: a diferença entre o mínimo médio da capa de gelo de 1979 a 1990 e o ponto baixo apresentado hoje, mais de 3 milhões de km2, é o dobro da França, Alemanha e Espanha juntos.

Os oceanos já absorveram 90% do excesso de calor gerado pelos gases de efeito estufa, mas a um custo assustador, com resultados como sua química alterada, ondas massivas de calor marinho e danos a recifes de coral.

E a certa altura, alertam os cientistas, esse sistema que absorve como esponja esse calor líquido pode ficar saturado.

O complexo sistema climático da Terra inclui as correntes oceânicas vinculadas entre elas, impulsionadas pelo vento, marés e algo chamado circulação termoalina, que é impulsionada simultaneamente por mudanças na temperatura e pela concentração de sal.

"Uma mudança na capa de gelo poderia interromper este tipo de "grande esteira transportadora", como é conhecida, de forma que traria consequências importantes ao clima da Europa", ressalta Nicolas à AFP.

Por exemplo, há quase 13.000 anos, quando a Terra estava em transição de uma idade do gelo para o período interglacial, algo que permitiu o desenvolvimento de nossa espécie, as temperaturas globais caíram drasticamente em vários graus Celsius. Aumentaram novamente cerca de 1.000 anos depois.

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