SÉRIE 'DEBATES'

País vive momento de decisões e discute seu futuro

Como deve ficar, e se comportar, o País, até o final os trâmites

José Ricardo Ferreira
ricardo.ferreira@gazetadepiracicaba.com.br
25/04/2016 às 11:06.
Atualizado em 28/04/2022 às 05:29
Manifestações que aconteceram no País (Rovena Rosa/Agência Brasil)

Manifestações que aconteceram no País (Rovena Rosa/Agência Brasil)

O rito do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff está em andamento no País. Favoráveis ou não ao processo, frequentemente estão protestando nas ruas. No domingo passado, a resolução da Câmara autorizando a abertura do impeachment foi aprovada pelos deputados. O Senado já recebeu a resolução e agora está em suas mãos os próximos passos. As etapas serão as mesmas adotadas em 1992 no impeachment do ex-presidente Fernando Collor. Segundo o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, o Senado deverá seguir o mesmo roteiro no processo de impedimento da presidente Dilma Rousseff. Resumidamente, haverá a criação de uma Comissão Especial para a análise do processo. Uma vez criada, essa comissão terá dez dias para acatar ou não a denúncia contra a presidente. Haverá discussão e votação nominal do parecer, pelo Plenário do Senado, em um só turno. Se rejeitado, o processo é arquivado e, se aprovado, por maioria simples de votos, a denúncia segue para debate. O trâmite pode parecer simples, mas exige muita atenção, pois se desenrolará em um cenário de muita tensão e pressões internas e externas. Se a denúncia for considerada objeto de debate, a denunciada (a presidente) é notificado para, no prazo de 20 dias, responder à acusação. Neste momento, o processo de impeachment é formalmente instaurado e a presidente é afastada de suas funções por 180 dias. Nesse período, após inúmeros trâmites, o presidente do STF relata o processo, mediante exposição resumida dos fundamentos da acusação e da defesa, bem como indicação dos respectivos elementos de prova. Há então o julgamento, em votação nominal, pelos senadores desimpedidos. Se condenada, a presidente ficará oito anos inelegível e seu vice, Michel Temer, assume até o fim do mandato. Caso contrário, volta a ocupar legalmente a presidência. Na análise do professor doutor Uassyr de Siqueira, do curso de história da Universidade Metodista de Piracicaba (Unimep), caso um novo governo assuma, o cidadão deve ficar atento às propostas que serão encaminhadas para  superar a crise econômica, com particular atenção para os direitos trabalhistas e para os programas sociais. “Seria um retrocesso qualquer tentativa de, em nome da austeridade e do ajuste fiscal, penalizar a população brasileira, sobretudo os mais pobres. Penso que o povo deve ficar atento também para quaisquer tentativas de interromper casos importantes de investigação, como as denúncias contra Eduardo Cunha, Renan Calheiros e Aécio Neves, citados nas investigações da Lava Jato. Será que, num eventual impedimento da presidente Dilma, as denúncias contra políticos da oposição iriam ser investigadas? Tenho muitas dúvidas a esse respeito”, diz o docente. Indagado sobre o fato de inúmeros vices-presidentes terem assumido o Brasil em momentos de crise, Uassyr de Siqueira faz um apanhado geral sobre esse tema. “Posso citar dois casos da história brasileira recente. No primeiro, José Sarney, que assumiu a presidência em 1985, após a morte trágica de Tancredo Neves, o primeiro presidente civil, eleito de maneira indireta, após 21 anos de ditadura militar. Sarney era oriundo da Arena (Aliança Renovadora Nacional), partido político de sustentação do Regime Militar. O governo Sarney representou o fim das esperanças pela redemocratização efetiva, pois a sociedade havia lutado pelas eleições diretas, no movimento Diretas Já, do qual o próprio Tancredo Neves havia participado”, lembra o docente. “No segundo caso, assumiu Itamar Franco, em 1992, após a renúncia de Fernando Collor de Mello, que enfrentava um processo de impeachment. Ao contrário do que ocorre hoje com a presidente Dilma, as investigações apontavam que Collor havia se beneficiado pessoalmente com recursos advindos de práticas ilícitas. Também diferentemente do momento atual, a sociedade civil se organizou de forma quase unânime a favor do impeachment, ao passo que hoje observamos manifestações tanto a favor quanto contra o impedimento da presidente”, explica o professor. “A partir dos casos citados, penso que, para a democracia brasileira, é muito problemática a possibilidade do vice-presidente assumir, pois isso, de certa forma, fere a ideia de soberania popular. Os vices, na maioria dos casos, compõem as chapas eleitorais para consolidar alianças pragmáticas para se vencer as eleições, e não necessariamente traduzem os anseios da população que deposita seus votos nas urnas. Assim, penso que, em casos de impeachment, o mais democrático deveria ser devolver à sociedade o poder de decisão, convocando-se novas eleições e o vice assumindo só de forma interina”, explica Uassyr de Siqueira. Ruptura Uassyr de Siqueira frisa que é importante entender que o impeachment ainda não está consolidado. “E, diante dos debates travados entre a defesa do governo e os defensores do impedimento da presidente, estou convencido de que o que está em curso é uma ruptura com a ordem institucional. As chamadas pedaladas fiscais não configuram crime de responsabilidade: todos os presidentes antes da Dilma utilizaram esse recurso, assim como governadores de vários Estados. Além disso, observando as falas dos parlamentares que votaram a favor do impeachment, notamos que tudo era usado como justificativa contra a presidente, menos as denominadas pedalas fiscais. Por isso, acredito que o governo ainda travará batalhas no campo político no Senado e também no campo jurídico, podendo recorrer às instâncias superiores da Justiça”, explica. “Penso que, caso o impeachment se consolide, o novo governo terá que se demonstrar legítimo ao povo brasileiro, uma tarefa bastante difícil de ser cumprida devido ao próprio desgaste da imagem do vice-presidente: há uma percepção crescente de que o vice Michel Temer seja um conspirador contra o mandato de Dilma, imagem que passou a se consolidar desde o final de 2015, além das denúncias contra ele que estão surgindo na operação Lava Jato”, analisa o professor. Uassyr de Siqueira ainda explica que a população não pode perder de vista os direitos adquiridos nas últimas décadas nesse momento complicado que o país vive. “Penso também que deveriam (um novo governo, em caso de impeachment) se comprometer com uma política de responsabilidade social, mantendo os empregos e políticas salariais que não penalizem os trabalhadores nesse momento econômico tão problemático”, disse. Em sua análise, porém, uma flexibilização dos direitos trabalhistas em nome da desoneração da produção está em curso. “Dessa forma, os trabalhadores poderão ser duramente penalizados”, diz. Os prós e os contras do impeachment O importante em um país democrático é dar espaço para todos opinarem. Nesse processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, a voz das ruas a favor do impedimento está mais alta e volumosa. Mas os que defendem a permanência de Dilma também estão fazendo barulho. O presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp e do Ciesp), Paulo Skaf, diz que o prosseguimento do processo de impeachment é a “vontade do povo brasileiro”. Para Skaf, o resultado na Câmara e a vontade do povo brasileiro devem levar os senadores a aprovarem o recebimento do processo de impeachment, com o afastamento da presidente do cargo até o julgamento no Senado Federal. O processo, frisou Skaf, tem acontecido dentro das determinações constitucionais, passo a passo, e não pode ser chamado de golpe. Para ele, golpe contra a nação foi o fechamento de lojas e fábricas e o desemprego, provocados pelo desgoverno da gestão atual. Claudemir Nespolo, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT) do Rio Grande do Sul, tem um pensamento diferente. “A votação do impeachment escancarou a enorme fragilidade da Câmara Federal. Diante do espetáculo bufão de domingo (17), prevaleceu o sentimento de estupefação. Até mesmo os vitoriosos degustaram um sabor amargo. Os sorrisos cínicos do mestre de cerimônia e as dedicatórias dos senhores deputados se transformaram rapidamente em piadas e risos, revelando de forma hipocrática a histórica promiscuidade entre público e privado da política brasileira. Foi o triunfo da pechincha geral. A democracia vendida em clima de final de feira”, criticou. Para os defensores de Dilma, o que está ocorrendo é um golpe. “O momento é de muita gravidade. A pauta subjacente do golpe coloca em risco os direitos sociais e trabalhistas e aponta para um governo ilegítimo e um avassalador retrocesso”, afirma o sindicalista. (Para ler mais: agenciabrasil.ebc.com.br, www.cut.org.br, www.fiesp.com.br).

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